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Esses dias quebrei meu relógio. Nem tive tempo de arrumar outro para por no lugar. Não sei se tem haver mas percebi que estou dedilhando menos pelos minutos e deixando meu corpo fluir pelas horas, pelo dia, e naturalmente ele vai. Não sei se foi nessa ordem. Será que flutuar assim fez o relógio quebrar? Ou o relógio quebrado me deixou assim? É círculo, círculo incerto e às vezes é mais dilatado, estourado, as vezes é fino, fino e a gente nem vê passar, de tão rápido que foi. Às vezes a gente está no agora. Eu estou no agora. Mas a pele sente como se fosse o agora de uma memória muito, muito longe, que eu já não lembrava por imagem. Mas que o tato trouxe de volta. Sentir. Eu tenho sentido de todas as formas. Minha pele e membrana me deixam entrar o que me cabe. Presenteio o mundo com que acho que posso e que sinto que ele merece. Às vezes entro demais, aí preciso abrir espaço, sufoco, assopro.. aaaan, alívio o nó da garganta. Me sinto nadando, quando a pele não está acostumada com a superfície que ela toca e parece que você sente cada milímetro dela, assim, assim mesmo. Quando ela não sabe direito do que se trata. Com o que tá lidando. Criança que brinca na areia. A areia já senti ela tantas vezes, mas me continua estranha, o pé precisa estar ali pra conferir. Afunda o pé na areia enquanto assiste o nascer do sol. E sente que ele é o primeiro de muitas maneiras possíveis. Sentir um fio, tão, tão fino que parece puxa tudo, na cabeça, no peito, no corpo, nesse magma todo. E amarra. E será que espreme e é isso que me faz lacrimejar? Eu chorei muito quando vi o sol nascer naquele dia. Porque o fio saiu para fora do meu corpo e ele trouxe o mundo todo, o mundo todo. O laranja, eu esperava toda aquela energia mas, não esperava aquele laranja. E ele veio porque quis vir. Fugiu do branco enevoado e foi puxado pelo fio também, veio, nasceu em mim, nasceu inteiro. Junto com o mundo inteiro, o Brasil inteiro. A América Latina inteira.
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